“Time flows in the same way for all human beings; every human being flows through time in a different way.”
Yasunari Kawabata
Escrevo-te, sem nome, para te dizer que a meio do inferno aprendi a viver.
As minhas costas tornaram-se um grande incêndio em forma de asa única, com cheiro a felugem constante, que espelha no meu rosto um olhar vulgar cravado pelo fogo que atormenta o dia-a-dia de cada um.  

Ainda me lembro do último dia que fui anjo. Sei que levava em cada mão um fim inevitável. 
Um deles partiu em teu nome quando aos poucos me tocavas em desassossego.
Não me restam tristezas pois as memórias foram o vento que manteram as chamas a brilhar.

Este fim é soante e compreensivo como a felugem que me dividiu. Escrevendo no céu a certeza que  desta vez não levo de ti qualquer tipo de saudade.


A Metamorfose do Infinito

I

Há muito que o vento sopra e a sua devoção se esbate contra as pedras que fui deixando para trás. Há muito que elas, imóveis, vêm todos os seus contornos serem formados, reformados, e desfigurados pela fúria de algo que não pode verdadeiramente lhes tocar.
Sopra a seus ouvidos e mesmo no ruído mais profundo as entende por surdas. Abrigando-as como a maior das sedes que a fartura lhe pode dar.
A verdade é que nada disto deveria pesar. São pedras soltas, no máximo são estátuas formadas.
Pesam como jardins cheios de espinhos de pedra e esperanças deformadas por fontes que se renovam na sua própria podridão. Tresandam ao doce cheiro da morte, o cheiro do perfume que paira no ar quando ela tenta escapar dela própria, deixando para trás um rasto de agonia sintonizada na própria deriva de não se reconhecer num momento de estranheza que é este de viver.
Sintoniza-te alta pois eu sintonizei-me com os pés demasiado à frente e para trás já não posso ver. Voltei costas, depois de tanto caminhar, para encontrar o espanto de um mero um sorriso distante que estalou como trovão num cimo demasiado alto até para os meus olhos ver. Tudo é do perdido, mas o perdido não é mais de ninguém.  Nas mãos dele tudo é cosido na carne e é tatuado no nosso avesso propositadamente para sentir. A pele rasga quando o esqueleto não mais o pode ouvir.
Infelizmente os ossos são fracos. Quebrados e tatuados por fracturas de todos os momentos que a vida nos foi capaz de sorrir. Estando com as pernas partidas, só agora percebi que carrego montanhas às minhas costas, amarradas à dor que se ergue ainda mais alto segue na minha frente, onde há apenas uma estátua com mil faces. Mil faces essas esculpidas a tristeza de todas as pessoas que amei mas que jamais serei capaz de amar.


II

Os anjos estão ao alto e os seus pés são de pedra.
Como é que um pouco de insanidade pode ser suficiente para justificar a recusa ao respirar?
O suicídio veio-se dentro dela, mas isso nunca foi motivo para engravidar. Até porque fecunda é a dor que se jorra pela pedra, tantos nas expressões cravadas nas memórias, como nos sentimentos forjados a martelo daquilo que o próprio tempo deixou. Abraçando, por fim, a erosão de tudo o que o intocável consegue causar.
O que resta em mãos?
Poeira de um céu que nunca chegou a brilhar.


III

A saudade é uma dor que a língua desconhece.
É uma fala que todos entendem mas ninguém a consegue traduzir.
É uma tempestade que cai mas nada consegue encharcar.
A saudade é uma arma que dispara, fere, deixando agonia pois não é capaz de matar.

Enquanto nos arrastamos, os sinos tocam todos os dias por nós.
Eu amava-a com a subtileza que na morte o som assim pode ser. Sabia a cada toque que a saudade um dia poderia apertar. Sabia que cada riso entoava a agonia mais na minha cabeça do que nas paredes poderia entoar.
Deixo-a sem nome, nesta fotografia onde o seu rosto hoje é difícil de reconhecer. A fotografia de quando tinha todos os mais nomes belos eram um bonito adereço para chamar. Deixo-me surdo, com a tristeza que a sua voz apenas será mais uma pedra para o vento levar.

Levanta-a até ao cimo da maior montanha que fica lá no ponto mais alto para o "eu" sentir.
Coroando um crucifixo que se ergue ao alto na ponta mais alta do meu pensamento. E o pior é que eu morro como todos os outros quando o último degrau para este caminho sem saída se formar. A diferença é que será já um pouco hoje. Outro bocado amanhã.
As minhas escadas são os meus próprios pés, feitos de incline para cima me sugar.
Ao que parece isto é existir...
Todos somos um longo tempo, uma única dor
E não é por nos juntarmos que o vamos expandir
Somos uma pequena irritação, um longo ardor

 
"Ask not the sun why she sets
Why she shrouds her light away
Or why she hides her glowing gaze
When night turns crimson gold to grey

For silent falls the guilty sun
As day to dark does turn
One simple truth she dare not speak:
Her light can only blind and burn

No mercy for the guilty
Bring down their lying sun
Blood so silver black by night
Upon their faces pale white

Cruel moon, bring the end
The dawn will never rise again."



A morte está (finalmente) sintonizada

Cinzas

A Reminisciência dos Ossos Condensados


Uma introdução no meio de nada, um desabafo no meio de tudo

Ultimamente sei-me ser, vestir e ir, sem rumo e sem ninguém, de uma maneira estranha pelas montanhas geladas do meu próprio pensamento. Sei o quanto bem rasgada é a pele do errado de mim lá do alto, que se ergue continuamente como topo aos olhos dos outros, como alto sem fim, onde a asfixia é apenas um passo contagioso, onde as nuvens desse teto acabam sempre numa rua de pó a duas paragens da tua.
Ali sinto-me sempre despido das mãos que estico, onde o vento me leva os sentidos como grãos de areia a voar até às planícies distantes deste topo onde estou. Mas os olhos voam para longe de mim...

Estou atado de ser! Dito-me e erro.
E tenho usado este resto de pedaços de tempo que tenho, também, para um novo colher das melhores plantas do céu, aquelas que nascem ao contrário do horizonte das nuvens, as que as suas sementes são relâmpagos que servem de semeio em mim e, todas as suas tempestades deitam-se a meu lado com um avesso nos seus próprios olhos.
Isto, no fundo, é nada mais que uma chuva miúda que cai algures cá dentro quando leio os grandes, e assim o tenho feito com uma pálida devoção, pálida de os devorar numa espécie de canibalismo intelectual dos mundos sustentados pelas palavras alheias. 
É ali que me dá uma vertigem, a vertigem sem altura e fico sempre a sentir-me demasiado pequeno num mundo de gigantes, os sem rumo que à voz dos pequenos sentem-se como dois olhos pensantes de pestanas incertas, onde tudo se sepulta fica debaixo de uma asa de um voo que se despista num oásis. Voo que por agora sinto não ser capaz de o voar da forma como o sempre esperei fazer. Mas sinto, também, um pequeno rebento de tudo o ser a nascer em cada um dos meus olhos, como uma estranha forma de existir além do além, mesmo sem convencer, de um dia ser maior que todos eles, mesmo continuando curvando-me na sua grandiosidade.
Mas nunca me ensinaram a ser grande! E quando o imaginava, uma mão afogava todos os meus horizontes. Apenas sei que quando era criança, na escola, apenas os meus feijões no algodão recusavam-se a germinar.

E isso faz-me um mal que só me faz bem! Como um alento de criança, imaginando do absurdo dos outros o mais certo de si!

Por mais que seja apenas um, mais um, tentado perceber o que é a vida, e mais do isso, juntar o perceber ao frágil sentir, hoje sentei os meus sentidos numa cadeira mais alta,  já que eles são meramente recetivos e chatos do que preciso, e como tal, agora sinto-os um grande alvo redondo nas paredes ao dispor de todos, onde que o faz centro vermelho do centro se sabe calcar. Com a diferença de agora as setas que são lançadas ao lado, e ao chão, começam a fazer parte de toda a pontaria que é ser-se de mim.
A verdade é que as pessoas hoje fazem-me um tipo de confusão que outrora nunca tinham feito. E eu sinto-me como uma doença num mundo de gente saudável, uma doença que tenta convencer de um oposto, sobre um outro oposto.
Como duas pontas que se odeiam sem se ver. 



Fonte

A grande fábrica de ossos

Há uma sociedade (de)pressão que varre-se em todas as esquinas como se de vento se soubesse ser. Deprimida, reprimida, e certamente na sua ideia vista como colorida, varre-se nas mãos de quem não se quer ver na outra ponta da vida, escondendo-se, entre artimanhas e furtos assertivos, para debaixo do grande tapete da gente pensante, onde as mãos são ritmo de uma ideia dançante.
E nada que se faça tão certo se pode dar ao dom de realmente o ser. Talvez porque, nós, pensantes e idealistas, julgamos ser aquilo que não podemos ser, enquanto aqueles cuja relação com o seu cérebro não é tão positiva estão sempre convictos de a ter.
Sendo assim, esta dança com o diabo, esta ilusão viva com centenas de olhos sobre o horizonte, não passa de uma reza a um deus que diz-se bom aos amigos, como gabarolas das coincidências, e que é cordeiro aos olhos das mães que vêm em nada a bondade que o reflete, principalmente quando o chamam aos olhos de um outro deus que o deus também pretende e espera acreditar.
Deus que é nada mais que a gramática corrente destes dias, desta modernidade, e prende-se cada vez mais a uma estranha descrença total vestida como revolta, não tão certa, não tão errada, que se lidera a pontos estratégicos por um defunto ser perdido pelo espaço. Então todo este fim responde-me se, por acaso do acaso, as estrelas serão a sua decomposição?
Não teimo. A ideia que teime desta vez comigo.

Vou escapar para ali, vou escapar para a carne. Vou ser radiografia negra a olhos brancos!
Vou ser a fratura, a solda, e o resto que falta ranger, sobre esse velho e sinistro coro, que me pede, com a bela e mais sincera voz, para não ter medo e morrer.


O ranger das ideias

Este é também o tempo que aprendi a fechar os olhos quando durmo. E sonho, sonho sobre sonho, numa base idêntica a um pesadelo, em que tudo é um nada mais de um fantasma dentro de outro fantasma, pois o mundo belo do primeiro sonho termina quando nesse também adormeço.
Chamo-o d'O abismo do sono. Ele a mim nada me chama.

Porém os olhos não ficam dormentes no sono apenas.
Fecho-os na vida, como se fossem ver no preto uma ultima vez. E desde esse instante formado que o começo parece ser um fim cantado da forma que a miséria, em silêncio, assim o poderia melhor cantar. 

No cimo desse silêncio ouço uma porta ao longe a ranger lentamente...
E eu que me oiço por todas as esquinas da minha carne! Todas as pequenas vozes incendidas pelo rei obrigado que as governa...

A porta fechou-se dentro de mim e eu caí sem ver as cores do mundo cá de fora.
Foi um raio de luz que lentamente foi fazendo as pazes com a escuridão e eu nunca soube viver.

Adversário assertivo! Somos todos pelo ir!
Não me lembro de ter sido criança, mas também não me lembro de algum dia a ter deixado de ser!
A vida até pode ser prosa, mas a morte é poesia!



A Lua sinistra

Tanto te pesas nessa marca, tão convicta e certa na carne, mas nunca foste capaz de fome de mim passar? 
E eu, a teu olhos, que sempre fui poeta varrido, teu demente consentido, aquele que sempre te fui mas já não quero mais ser, dei-me ao luxo de ser solene e acabei como a maior loucura que preferiste adiar?
Se me tinhas, e tanto me tiveste, porque foste com a mais bela roupa ver o mundo e se ele ainda tinha à venda o que procuravas em mim?
Não me fazes apenas um saldo do teu momento. Deverias saber-me pelo valor.
E agora sou o primeiro a dizer-te que podes pensar, como fruto de toda essa rebeldia pensada, e mais vendida que mascarada, que tudo o que me podes vir a cantar é hoje uma musica que já ouvi?
Lembra-te que eu sou surdo e que resta-te o banal agora, a procura pelo quadro onde é retratado o coração fantasiado dos valentes, que é no fundo apenas um relógio sem pilhas que nem as duas vezes do dia consegue acertar.
Aqui regenera o que a vida te tirou muito antes da morte chegar, o sonho que não é a calma que o faz, nem a ânsia que o traz, mas sim o ardor do vazio que o farão sentar no alto altar para o domar.

Sabes-me mal. E sempre te soube bem saber-me.
Mas as minhas pontes regem-se por pontas onde não há terra para as segurar.






Fonte


A última fratura do sono (A minha lua em pedaços)

A futilidade nada é mais que um mero acaso em forma de pó, um jeito, um simplório fantasma. Que ainda perdido no outro mundo, está atrasado nos dois mundos. Vive e serve-se dessa fragilidade apenas pintando-se a si, como um palhaço sem graça, e gabando-se frente a um espelho que, na verdade, nada consegue refletir.
E tu, mais que nunca, pareces-me ser o rosto que ele procura. A dor que ele diz sentir, e o caminho que ele pensa caminhar. Mas corda dos teus sapatos anda mais rápida que a minha.
Ainda só sabes ser pouco para olhar e realmente ver algo para trás.



....

Socorro! socorro! 
Livra-me deste perpetuo agora! 
Deste momento consistente mas desligado das duas pontas ao alto e sem fim!

Que sou quando corto a linha?
Para trás, certamente, cavalheiros, uma grande peça de tecido para vender que em vida sempre se julgou convencer! 
Para a frente, cavalheiros, apenas um novelo sem rumo, redondo como a casualidade!

Tomba o abismo lá do cimo da montanha! 
Agarra a terra que o chão te sorri, e sorri também para ela. Sobe ao sitio mais alto que conseguires chegar, e por favor, sem sair dentro de ti, cerra o pulso e atira toda a terra das mãos ao vento.
Aí despedes-te de mim.



Fonte


... E se algum dia existirem olhos suficientes para o meu virar pedra, só espero ter alguém que sobre ela lhe faça tirania e confusão ao pó sobre o mundo que a sobra.





....





Quando vejo as merdas que maior parte de vocês escrevem, só me dá vontade de me enforcar.
Abana a corda com o ridículo. Hoje tornei-me um caixão lacrado.

A Capital do Silêncio Profundo

São tudo ruas amplamente vazias mas cheias de gente. Paralelas, mortas, cruzadas, e cheias também de sinais em todas as direções, mas que não levam ninguém a lado nenhum.
São como mapa pela certa, mas sem a vontade de se achar, e são como tesouro mas sem mãos para serem desejadas, procuradas e roubadas.
São erguidas como um monumomento em todo o seu louvor, mas sem tempo de ser ou arte de ver, sem momento ou monumento, são apenas dor, um basta de quem não sabe ao certo o que é viver.
E quem aqui nos fez e aqui nos construiu e, continua a construir, teve sempre uma velha e louca fantasia pela ruína. Pelos pedaços caídos de lágrimas a dois, e pelo seu próprio sorriso cínico de nos fazer amar algo que a morte nos pode a qualquer momento tirar.
Esta Roma do coração é mais fantasia que chegada, mas fim do que partida. E tudo isto me chama a agonia leve, tanto de pensar, mas não tanto de a viver, como todas as sirenes sem fim que levam numa maca a escrita, já como restos mortais de palavras, de toda esta mediocridade da minha própria presença.
Caramba! Logo agora que os dias são altos como sinos nesta Terra! Porque têm de ser estas noites, essas pequenas despedidas ao entendimento, assassinas do amanhã? Que escondem-se, nesta apanhada com os nossos olhos nos momentos em que as estamos quase a agarrar?
São sonhos atados, diz-me o coração. E felizmente que este pobre inquilino de mim esteve sempre mais ocupado com o meu sangue mexer e remexer do que amar. Não que hoje me possa queixar, ou na verdade falar, de toda a construção que um sentimento pode ser.
Como uma linha de montagem de amor, este matadouro sobre o ser é, segundo a segundo um novo ardor, momento a momento uma nova dor. E no fim alguém ainda o quer comprar?
Mas uns compram-no! Gente que vale saldos faz divida de si para o ter, e como se o fim não fosse um basta, embrulham-no para entregar. Dão mas não sentem, não sabem. Pelos outros são abertos, esses nunca souberam pedir. Vamos inventar um novo motivo para festejar.
A dor também faz anos e a essa ninguém se lembra do seu aniversário. Evento sem nome, esse é apenas um momento, convidado pelo tempo, de um conjunto de construções simbólicas que não se conseguem entender entre si.  
Estão todos atados ao vazio. Estão todos suspensos no ar. Juntos com estes sonhos atados, estavam-se todos em demasia para uma corda que nunca os prendeu na verdade. Mas aqui ninguém se sente livre, nunca sentiu. Apenas o disse sentir.

Lembra-me quando a memória for apenas um soprar de mim na ideia dos outros...
Será esse o pátio onde nos deveríamos encontrar?

A Lua Vermelha e o Vazio (Própria Autoria)


Viver é uma coisa fútil, feia, e certamente sem solução.
Mesmo pesada como revolução, a vida em si é tão absurda para quem pensa, que a própria já se bofeteou inúmeras vezes e agora passa todo o tempo a sangrar do nariz.
O mundo é este eco fantástico, e nunca mais existir certamente é uma dor que só vou poder sentir enquanto viver.
Do nada nascemos, mas a pessoa que morre connosco certamente não é a mesma que em nós nasceu.
Mesmo uma criança morta, sabe-se pelo não saber que na sua existência aprendeu a chorar.

Um dia, na outra ponta, e o meu tudo saberá o cessar.

s. t. s. s.

Há imensa coisa que tenho a dizer, mas parte dela não pode mais ser dita.

1963, Malcolm W. Browne, World Press Photo of the Year

Por momentos pensei estar demasiado triste para escrever, mas quando me vi a espreitar à minha janela enquanto aqui me sento, tive um simples momento em que nunca me julguei como uma pessoa verdadeira alegre no reflexo do vidro que ali foi deixado a ver.
Embaciado apenas, mas tenho que admitir que estou apenas cansado de todas as manhãs em que me lembro de acordar, em que há um galo sobre a minha cama. Canta, recanta, e apenas ele pensa que encanta. No fundo apenas espanta. Espanta como fantasma nos dias mais claros de se viver ou nas noites em que ninguém tem tempo para pensar em dormir. É tudo como uma certeza apagada e passada a limpo pelo duvidoso escritor do que poderia ter sido ontem.
Propaganda crónica de um ego, pensa ela na razão. E ela? E amanhã? Fazes jejum dele?
Não importa o conto de ti, pois deixei um bilhete no teto e só preciso de dizer que não sou nada do que sonhas. Do que pensas que sou. Ou daquilo que poderia ser.
Sou um mero êxtase do momento, uma consequência demasiado pensada que foi deixada de lado pelo momento em si. Como um começo de uma vontade deixada a meio pela advento razão, o frio na noite de inverno quando te viras na cama e ficas incomodada. Mas te esqueces que do outro lado está ele.  

Mas o mundo não é uma anedota nas bocas daqueles que o contam? Então porque não vejo ninguém a rir? E se riem, porque fingem um sorriso que pesa demais quando a solidão chega e os encontra num simples canto com quatro esquinas a chorar?
Sempre achei que o maior caixão que levavamos para a terra não é aquele de madeira, mas sim aquele que é feito de nós. Não porque as minhas cicatrizes sempre teimaram comigo o que não deveria mostrar, um estranho avesso da dor, mas pela propria ideia de uma alma que é fabricada dentro de uma vagina com o propósito de um milagre.
Milagre, talvez seria um deus tão medroso que teve medo de existir! E não apenas nesse sentido, morreu na velhice quando ainda era novo. Esqueceu-se de pentear a vida, e a vida despeteada é orientada pelo vento que a morte sombra, e não é rapando-a como pelos que lutam por subir de divisão que o amanhã espera no horizonte.

Sei-me, e odeio as contas deste saber.
Porque de tanta coisa que me deram a escolher, decidi ser eu.
E isso é o maior troféu que se esqueceram de me dar. Mas o galo, disfarçado e comendo o milho dos outros galos, tantos galos, é aquele que ainda abre o bico para cantar.
Acordaste na cama com a vida, mas esqueceste-te que eu aqui fui o primeiro a acordar.
Deixei a cama fria. Mas continuo calado e deixo-o cantar. Vou deixar tudo para manhã e não apontar nada nos meus afazeres.

Esta é a nota onde penso estar escrito: "Hoje deixei de fazer sentido."
Encontrámos-nos, um dia, no andar de cima da vida. E até lá, peço-te por favor, vive a vida pelas escadas, as paixões pelos degraus, porque o meu elevador é nada mais que as ruínas da tua alegria esquecida debaixo, numa vala comum de mim, dos sorrisos que finges viver.

Elegias do Coração sem Dono: I - Vermelho Escarlate


Fonte
A marcha é triste, lenta e todos na rapidez do silêncio a entendem. Por esta ser em contra mão não gera prazer, nem dor, mas antes o reflexo do mundo que tornou-se nessas mãos que tanto precisam mas que tanto encontram dificuldade em se esticar.
E eu sou um doente com demasiadas curas, um crónico inadaptado aos olhos alheios e às crónicas que são, ou numa hipótese mais realista de mim, que seriam fáceis de assinar.
A tristeza nunca significou tristeza para mim.


 A lua de sangue

Quando os tubos se erguem e se entrelaçam na minha pele, sei que a dor de alguém é apenas uma salvação a vermelho. Sempre ouvi dizer que para se ser herói não era preciso usar capa, portanto qual será o nosso super poder?
Mas se todos somos herois, e por pouco fazer, será possível encontrar um lado belo neste caminho?
O sofrimento dos outros, e talvez um dia o meu próprio sofrimento, são uma dádiva que de mim encontra um fim. E se, tudo o que penso, tudo o que sinto, são fluxos que por mim existem, por mim circulam, e se quisermos ser mais previsíveis, que no coração se fazem,  então o meu sangue é apenas um vontade também de ti. Um constante correr que me faz lembrar na vida que te quero além da morte.

Podes tu me dizer:
- Mas ele coagula!

Deixa-o coagular. Deixa a morte encontrar os nossos pecados e os sinos tocarem as nossas ultimas vontades. Existes nas vertigens de mim. Vives no meu pensamento e tens a vista mais bela para dentro de tudo o que sonho em nomes a mãos dadas.
Não é a tristeza que se seja farsa, nem a farsa se sinta tristeza. Este é apenas o tempo em que o sangue dou, e nesse pedacinho vivo de mim, também encontras caminho para partir comigo.
Dar-me é dar-te. E dar-mos-nos é vivermos no coração dos outros, circularmos em centenas de outras vidas.
Este é o nosso bater. Rumo certo até a uma eternidade possível.

Nympha Somnii


 
Fonte


Aos monumomentos

A existência é um belo cadáver lançado ao mar.
Tão belo, e tão amarrado de pés com braços, que foi lançado para bem longe daquilo que pensamos poder ser. E logo aqui neste pátio, onde chegamos, sem nunca ter partido, encontramos a cruz espetada no coração de todas as coisas onde marcamos-te no agora, pensamento constante e diário, como tesouro à espera de ser encontrado.
Mas onde andam os mapas de nós?

Quando o podre acena o mar, e a carne se torna nada mais que um barco de vermes de barriga cheia de nós, as tempestades levantam-se e rugem como leões famintos de dor que nunca souberam a cor de viver foram de um jardim zoológico!
E neste universo que asfixiamos, onde o fundo do mar é apenas um teto que julgamos caminhar sem nunca termos saído da beira da areia, as memórias são apenas um prazer esquecido num até já.
É o tempo que nos espera, enquanto o tempo, tempo o ter. Mas a lua esta noite fica de bico de pés à espera das estrelas que acreditas morrerem, uma por uma.
Afinal de contas todos são apenas comandantes em espírito de um corpo pesado de mais para flutuar nas coisas que acredito. Tentas ser como navios fantasmas, os que trazem boas noticias em mãos, apenas quando deles poderes ser para as entender. É a marca que não poderás mais navegar.

Mas a culpa é do homem e da mulher! Que quando o lançaram ao mar, o belo cadáver, esqueceram-se que as ondas que nos batem nos pés são os segundos que nos restam. Voltam a nós e não pensam como chegar.
Momentos são monumentos, mas monumentos serão momentos? Momentos longos são apenas pedra.
Passamos a vida a sonhar com o infinito fundo do mar. É uma pena, parece que a eternidade sempre nos visitou acordados.

X III MMXIV

Aos nossos belos segredos

Ergo as aspas, mas não falta mais nada. E talvez, seja como parte de mim, citando-me em cabelos, em actos, e em devoções, com um aceno que se ergue em segunda mão para nunca ter pretexto de partir. Como um acreditar em todas as noites secundárias, aquelas distantes do ontem.

- Faltas tu.

Poderia ter-te sem nome. Dentro de mim algo saberá como te chamar.

- Eu sou quem tu quiseres.

Quero que sejas o que dentro de ti quer ser. A crua, a dura, a que semeia sonhos. A minha pequena nuvem. Aquela que sobe na minha imaginação. Resta um pensar distante.
Não te posso agarrar, não o posso agarrar.
Ele é como a minha pele.
Esta noite destilo rios de amor por ti.

- Esta noite?

Esta noite destila. A noite passada transbordava. A próxima noite sufocará.
Entras em mim, vestes a minha pele. Mais que palavras, mais que pretextos. É um digno significado.
Escrever-te é libertar um estranho poeta adormecido na paixão. Ele sabe nos teus olhos todas as palavras julgar.
E no fim tu és a sua sentença, um castigo eterno que se quer marcar na pele, como uma virgindade furada.
És-me como ser. Uma vontade. Um ter. Uma morte desenhada a cores no viver.
Espero de coração que esta noite nunca mais acabe.

- Tenho tido saudades tuas...

Meu amor, não tenhas saudades de algo que existe no fundo de ti.

- O que se passa esta noite? Espero que nunca deixemos de existir. Meu eterno.

Esta noite é fogo pintado de gelo. Eu sou apenas um pedacinho de vida que conheceste.
Tenho um mundo, um estranho e vasto mundo.
Entras-te pelo buraco da agulha com que coso a minha própria paixão.
Por tua causa estou deitado, paralisado e já não sei mais quem sou.

- Mas eu, deitada, sei quem tu és para mim! És a pureza e a sinceridade, um ser delicado que deve ser manipulado como dinamite. És negro, és profundo, és luz na minha alma.

És também melodia.
A parte estranha desta nossa meia dose de luar não se fica pela escassez na nossa gula de um pelo outro. Este luar é aquele que que tens as minhas palavras arrancadas da boca sem os olhos terem tempo de as olhar.
É a sensualidade de uma sombra sem rosto.
Um suspiro vazio de uma noite perdida nos braços de quem nos encontra.
Sabes? Gosto de te imaginar como princesa. Não como as dos contos, muito menos como as das fábulas. Mas sim uma versão real, perversa, cheia de significado.
Das flores, pólen de sonhos, seguem como gira-sois que fizeram greve à luz do sol, e erguem ondas de braços. Cada um segurando uma espada, um escudo, em nome de poesia proibida entre nós.
As palavras são ereções.
Patinam, escorregam. São pontes em bicos de pés para te chegar.


Entoa na janela um suspiro.

És quem me rasga a pele e a roupa. Apenas com o carinho mais sincero que senti.
E no dia que a sombra virar arrogância, certamente que a lua se irá rir.
Não há espaço para nomes quando dois mortais sentem por instantes experimentar a imortalidade.

- Sempre gostei de ti. mesmo antes de te conhecer. Sempre que ela falava de ti. Falar contigo, abrir-me contigo. Devorar tudo de ti. Fazes parte dos meus pensamentos e ultimamente mais que nunca.

Esta é a nossa forma. Uma vontade acima da matéria, uma forma que poucos conseguem estar.

- És proibido, és apetecido. Sei como te agradar. Representas um lado escuro que anseio penetrar. Já te disse que te adoro?

Já. Mas podes voltar a dizer, repetir o infinito nos teus lábios. Podes repetir com todas as palavras, com todos os bater de asas.
Somos proibidos, e isso só me faz a mim feliz.
Como se fosse um demónio, um corvo negro que te sente tão, mas tão, ansiosa por mim.
A magia que te toque, e voe para mais ninguém pode voar.
Sou anjo, e tenho sorriso congelado. É desta forma ardente de te ter nos meus braços.
Mas também me fazes escritor, aquele que sempre quis ser.

- Acho fascinante o poder que conferem às palavras. O calor que despertam a cada virar de página. A vontade de continuar sem nunca mais parar. É divino.

É a vontade do teu nome, das palavras que peregrinam para ele agradar.
Princesa proibida. Se nos raptarem por meses, sei que estarás para continuar a nossa dança.
Sem marcas, apenas com a vontade a rasgar.

Esta noite assinamos a meias com fogo ao luar

Divisor Simbólico

... De mim para mim...

Decidi ser normal. Para ser diferente já bastam todos os outros.

Mors Principium Est

Os começos são sempre o maior desafio à chegada.
Há, nas arrecadações do mim, um repouso constante. Uma vontade inédita de ser o programa de televisão mais repetitivo da História. Ser alma de estreia, como quem sente e pensa mas não pensa sem sentir, de uma obra repetitiva, e espiritualista decadente, inaugurada durante anos com as sementes que foram sintonizadas em sinal de todas as vontades, e todos os testemunhos, de uma doença rara e imaginária cuja cura esteve sempre no lado de lá.
O programa não é feito pelas cores, nem pelas pessoas que o poderiam ter visto, é antes pelo formigueiro constante e ruidoso que sai do ecrã a cada pestanejar, a porta que entra nos nossos olhos como a única e maior verdade a seguir.
Quem se deita no pântano sobre escuta da terra firme sabe que a vida é capaz de ser demasiado seca, e deixar-nos, mais uma vez, de mãos dadas com a frieza de um deserto depois do sol se por. Mas será que ele foi o primeiro a partir?
Rejeitei o sol porque rejeitei-me a mim mesmo. E a lua não esteve por aluguer, ou por ocasião de mim. Todos os dias tombei sobre mim e vi-me morrer aos poucos.
Mas só agora vejo-me a decompor.



Sewn Chaos Orianna by Kytru

A decomposição das vontades

Entra pelas traseiras mas deixa a porta aberta, e como quem pensa uma marcha longa e silenciosa, um ritual preso e doloroso a uma antologia distante que se perpétua nos olhos escorridos de hoje, sente as lágrimas do amanhã. Um traço constante, que acabando se ser riscado, atende a denuncia do esconder do ontem como o sinalizar do agora com os sinos do próximo instante.
Quem se atreve a dar-lhe a mão enquanto caminha numa linha estreita para horas de inexperiência rica a ser extensão de viver?
Dizem-lhe que o tempo pediu tempo ao tempo mas não mais terá de o fazer. Os jardins são frios e as árvores crescem cortadas. Os bancos apenas aconchegam o resto do que se perdeu e os lagos reflectem pontas de sonhos que poderíamos viver. O reflexo é a dor do que se afogou debaixo do gelo. E o céu, esse tecto feito de nuvens geladas, serve-se da pintura de quem um dia assim o pretendeu, pintando o tempo, de tempo a tempo, com um tempo onde ninguém tem sabe o que é o tempo.
E quem abre as pernas ao luar arrisca-se a ter a luz de bicos de pés a espreitar. Como esperança de órgãos estilhaçados, daqueles que julgam ser o quem que aponta a quem corre, mas deixando os olhos vaguear sem vontade de olhar, sabendo-se pela fractura do dia em que nada mais se poderá alcançar.
Todos caímos no chão, e muitos de nós não encontram mais razões para se levantar. Começando assim o Verão da nossa decomposição.

Sintetizando a carne e a terra...


A decomposição dos sentimentos

Todos aparecem nesta partida. De costas, sem mãos nem passo nesta rajada de ser.
Amar é ergue-se como trono onde as espadas nunca se cruzam pelo lado mau. Todos os cortes são guerras perdidas, e também ganhas por alguém, em nome daqueles que chegam para ficar e sem reino para governar. Mas parece que todos eles se esquecem que gostar de alguém é um sonho a meias entre um demónio sonâmbulo e um anjo que não consegue dormir.
Hoje sei que não sinto a falta de ninguém. A outrora mão ao ar não me incomoda mais ao ver partir.

Este é um momento leve.
Decomposto como a vontade de se decompor. Silencio solene, frágil e habilidosa forma de agir.
Vestindo a pele de quem jamais poderá sentir.


A decomposição dos sonhos

Há um horizonte que nos separa. A nós, no sentido em que todos os podemos ser, uma vez que as peles se tornaram uma ocupação de pensar. Pensar é existir, pesar é ocupar. A leveza dos sonetos devem ser deixados como um sonho. Pés em bico, frio nas mãos, e todo um céu virado do avesso apenas para se redimir.
O dia chegou sem a esperança de amanhecer. De perto a noite diminuiu-se no horizonte como um aceno distante a tudo o que em terra se foi coagulando. Mas já assim não tinha acordado?
Fechar os olhos é sonhar em contra mão.
Memórias esquecidas são momentos que nunca existiram.



Funeral Fog


A decomposição da existência

Dentro e fora, despido de ser este é o principal sonho de mais um fraco sonhador
Réplica inacabada, triste fado, mais que uma ode ao simbolismo deste divisor


...


... Há um monstro que nos espera. Se senta, e nos vê crescer. Uns apontam em nome, outros em nome escrevem, mas no fundo todos acabam em tinta o apagar. Dentro de nós, como quem canta e males não espanta, ele julga-te pela história, pelo soneto e pela diferença que no teu alto rés do chão a vida é mais ventosa que a própria vontade de ser.
Tu, pobre e rico tu, que viste os capacetes marchar, os rios levantar, o betão dominar...
Tu, certeza escura sobre a luz, que terás tanto para contar... 
Mas o teu silêncio interrompe-te! E onde estou eu agora? Perto. Longe. Certo no espaço e na disposição de sentir, mas só, morto e apagado, quando seria a minha ultima vontade de te ouvir.

Quimera
Fonte