“Time flows in the same way for all human beings; every human being flows through time in a different way.”
Yasunari Kawabata

Divisor Simbólico

... De mim para mim...

Decidi ser normal. Para ser diferente já bastam todos os outros.

Mors Principium Est

Os começos são sempre o maior desafio à chegada.
Há, nas arrecadações do mim, um repouso constante. Uma vontade inédita de ser o programa de televisão mais repetitivo da História. Ser alma de estreia, como quem sente e pensa mas não pensa sem sentir, de uma obra repetitiva, e espiritualista decadente, inaugurada durante anos com as sementes que foram sintonizadas em sinal de todas as vontades, e todos os testemunhos, de uma doença rara e imaginária cuja cura esteve sempre no lado de lá.
O programa não é feito pelas cores, nem pelas pessoas que o poderiam ter visto, é antes pelo formigueiro constante e ruidoso que sai do ecrã a cada pestanejar, a porta que entra nos nossos olhos como a única e maior verdade a seguir.
Quem se deita no pântano sobre escuta da terra firme sabe que a vida é capaz de ser demasiado seca, e deixar-nos, mais uma vez, de mãos dadas com a frieza de um deserto depois do sol se por. Mas será que ele foi o primeiro a partir?
Rejeitei o sol porque rejeitei-me a mim mesmo. E a lua não esteve por aluguer, ou por ocasião de mim. Todos os dias tombei sobre mim e vi-me morrer aos poucos.
Mas só agora vejo-me a decompor.



Sewn Chaos Orianna by Kytru

A decomposição das vontades

Entra pelas traseiras mas deixa a porta aberta, e como quem pensa uma marcha longa e silenciosa, um ritual preso e doloroso a uma antologia distante que se perpétua nos olhos escorridos de hoje, sente as lágrimas do amanhã. Um traço constante, que acabando se ser riscado, atende a denuncia do esconder do ontem como o sinalizar do agora com os sinos do próximo instante.
Quem se atreve a dar-lhe a mão enquanto caminha numa linha estreita para horas de inexperiência rica a ser extensão de viver?
Dizem-lhe que o tempo pediu tempo ao tempo mas não mais terá de o fazer. Os jardins são frios e as árvores crescem cortadas. Os bancos apenas aconchegam o resto do que se perdeu e os lagos reflectem pontas de sonhos que poderíamos viver. O reflexo é a dor do que se afogou debaixo do gelo. E o céu, esse tecto feito de nuvens geladas, serve-se da pintura de quem um dia assim o pretendeu, pintando o tempo, de tempo a tempo, com um tempo onde ninguém tem sabe o que é o tempo.
E quem abre as pernas ao luar arrisca-se a ter a luz de bicos de pés a espreitar. Como esperança de órgãos estilhaçados, daqueles que julgam ser o quem que aponta a quem corre, mas deixando os olhos vaguear sem vontade de olhar, sabendo-se pela fractura do dia em que nada mais se poderá alcançar.
Todos caímos no chão, e muitos de nós não encontram mais razões para se levantar. Começando assim o Verão da nossa decomposição.

Sintetizando a carne e a terra...


A decomposição dos sentimentos

Todos aparecem nesta partida. De costas, sem mãos nem passo nesta rajada de ser.
Amar é ergue-se como trono onde as espadas nunca se cruzam pelo lado mau. Todos os cortes são guerras perdidas, e também ganhas por alguém, em nome daqueles que chegam para ficar e sem reino para governar. Mas parece que todos eles se esquecem que gostar de alguém é um sonho a meias entre um demónio sonâmbulo e um anjo que não consegue dormir.
Hoje sei que não sinto a falta de ninguém. A outrora mão ao ar não me incomoda mais ao ver partir.

Este é um momento leve.
Decomposto como a vontade de se decompor. Silencio solene, frágil e habilidosa forma de agir.
Vestindo a pele de quem jamais poderá sentir.


A decomposição dos sonhos

Há um horizonte que nos separa. A nós, no sentido em que todos os podemos ser, uma vez que as peles se tornaram uma ocupação de pensar. Pensar é existir, pesar é ocupar. A leveza dos sonetos devem ser deixados como um sonho. Pés em bico, frio nas mãos, e todo um céu virado do avesso apenas para se redimir.
O dia chegou sem a esperança de amanhecer. De perto a noite diminuiu-se no horizonte como um aceno distante a tudo o que em terra se foi coagulando. Mas já assim não tinha acordado?
Fechar os olhos é sonhar em contra mão.
Memórias esquecidas são momentos que nunca existiram.



Funeral Fog


A decomposição da existência

Dentro e fora, despido de ser este é o principal sonho de mais um fraco sonhador
Réplica inacabada, triste fado, mais que uma ode ao simbolismo deste divisor


...


... Há um monstro que nos espera. Se senta, e nos vê crescer. Uns apontam em nome, outros em nome escrevem, mas no fundo todos acabam em tinta o apagar. Dentro de nós, como quem canta e males não espanta, ele julga-te pela história, pelo soneto e pela diferença que no teu alto rés do chão a vida é mais ventosa que a própria vontade de ser.
Tu, pobre e rico tu, que viste os capacetes marchar, os rios levantar, o betão dominar...
Tu, certeza escura sobre a luz, que terás tanto para contar... 
Mas o teu silêncio interrompe-te! E onde estou eu agora? Perto. Longe. Certo no espaço e na disposição de sentir, mas só, morto e apagado, quando seria a minha ultima vontade de te ouvir.

Quimera
Fonte