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S. C.
Parte I
Uma vez escorrido pelos tempos, o vento é o melhor amigo dos gritos despenteados da natureza. Propaga-os, no próprio asilo do sopro, como um eco entrelaçado que corrompe a sedução dos vastos campos de flores que a humanidade se deita sem conhecer. Os fantasmas daquilo que chamam “amor de mãos dadas” são apenas frágeis acenos de quem unicamente sabe olhar o céu, e prometer estrelas que morreram a pregar sonetos nocturnos a um sol que nunca conseguirá espreitar a sua honestidade.
Como começo letárgico e catatónico, a minha mente floresce desta falta de confiança nas mãos. As estrelas, com pétalas inatas do coração, são apenas uma projecção imaginária que a negligência tende a relembrar como causa perdida. Por isso pergunto-me, todas as noites antes de adormecer, quem é verdadeiramente insano para amar os girassóis?
A verdade é que toda a sinfonia do pólen curvado e deprimido ao mergulhar na noite, pintado por um narrador de uma história encantada pelos vultos apaixonados, fecunda cada vez mais esta alergia que é amar. Falta-lhes a rosa viva e vermelha, amarrada a sorrisos e a espinhos, aquela que merece todo o orvalho a seus pés. A que cresce na terra de quem se curva, perante a honestidade da sua beleza, aquela que não teme os pés descalços pelos caminhos do campo.
Da terra floresce o sorriso sincero, e os jardineiros amorosos tentam rasgar-lhes os espinhos. Vivem um conto de fadas medíocre, argumentado pelo típico “era uma vez” poético e tenebroso de uma felicidade que se resume a um aceno, falso, num para sempre que é, ironicamente, incapaz de chegar ao agora.
Aqui jaz a asfixia da minha frágil existência, que cai de joelhos e fractura os ossos mais importante da alma: aqueles que verdadeiramente pretendem abraçar-te juntamente com os espinhos.
Não esqueço que as liberdades de cada um correspondem a esse oceano fracturado, vago e submerso nas rotas dos barcos de quem apenas os sabe navegar voltado para a terra. O hino desse afogamento constante entre o ego e bricolagem forçada por parte de alguém.
Por isso todas as noites quando vou ao jardim, e vejo que a terra é apenas um sonho onde as tuas pétalas vão caindo, calo-me para mim mesmo fragilizado nas impossibilidades que a beleza me sussurra ao ouvido. Um gemido, daquele velho vento, pinta a distancia que nos separa, sem acenos, rostos e sorrisos.
É aí que te grito silenciosamente, sem saber o teu nome, para florires sobre o sol mais resplandecente sem medo dos teus próprios espinhos.
São eles que fazem as mãos de quem verdadeiramente te quer abraçar.
Parte II
Sempre me considerei uma pequena criança a escrever. Não o faço por qualquer profissionalismo, obrigação laica da razão ou arranjo florista de uma mesa que serve de jantar a quem passa fome de algo que nunca provou. Prendo-me, apenas, à pura imaginação simplista da ilusão colorida num mundo a preto e branco, das cores frágeis e do pintar de folhas sem sentido de quem, inconscientemente, vive a necessidade de asfixiar-se entre palavras para sentir os braços no horizonte de costas voltadas à despedida. Rasgo-me em tintas quando (te) escrevo.
Se a primeira parte fica-se pela terra florida de estrelas onde os mortais caminham com ecos do que ainda está por percorrer, esta ascende na noite como uma orquestra de grilos numa colina virgem vendida ao homem mais pobre do mundo. Este apenas vive um sono cantado como um triste fado, o sonâmbulo milionário que adormece no próprio sono, como uma fada de um conto de adultos aborrecidos. Ele pensa escalar os sonhos de quem nunca nada viu. Pensa, talvez sem nunca verdadeiramente pensar, demais na terra e esquece-se que as nuvens fazem os desenhos mais belos ao acaso. Por isso, apenas te peço para me perceberes nas noites a duas luas, como um cego que numa amarra de ti, não consegue fazer-se sonho de algo que nunca conseguiu ver.
Se é o teu vermelho das pétalas que encanta toda a sinfonia do tempo dançante, porque é que é os poemas em teu nome acabam doentes numa cama de hospital literário? Eu que nunca tive o dom de escrever belas coisas, vejo-me na subtileza de te entender, como um dogma credível de ficção, para ajoelhar todo um dicionário ao simples florir de um anjo com asas feitas pétalas. A expressão que consegue colocar todos os demónios debaixo de uma mantinha a tremer de medo.
Arrepende-se a terra da vida que te deu, como o mais belo poema escrito em teu nome nas costas do céu. Ninguém veste a devoção da alma quando se ergue perante estas palavras. Eu não sou como todos eles, pois a gentileza faz-me prisão daquilo que eu aspiro num mundo em sentido contrário, em que a falsidade pinta a cara de quem respira. Por vezes confundem-se os verdadeiros rostos.
Talvez a porta das contas mal feitas sejam pequenos poemas que vêm escritos nos pequenos pacotes de açúcar. Ou simplesmente somos uma tristeza que alguém anda a chorar algures por aí, sem verdadeiramente saber quem és.
E eu o que sei?
Apenas há momentos em que ainda não fui ao teu encontro, e já comecei a sentir a tua despedida como um aperto daquilo que sei que me vou esquecer de dizer.